Não é novidade para ninguém que os incêndios florestais têm assolado violentamente todo o Norte de Portugal Continental, muito especialmente o concelho de Montalegre e muito concretamente, porque é isto que verdadeiramente nos incomoda, todo o Baixo Barroso, zona de intervenção geográfica dos B.V. de Salto.
Embora, e por diversas vezes, tenha sido convidado para tecer alguns comentários sobre esta triste efeméride, outras tantas vezes me recusei a fazê-lo, por várias razões:
1º - É um assunto triste demais para ser comentado e pouquíssimo se pode dizer sobre isso, até porque, as imagens resultantes desses tristes acontecimentos falam por si, dispensando qualquer tipo de comentário.
2º - Sou da opinião de que falar sobre coisas tão melindrosas como estas, se pode despertar mais mentes perversas para a continuidade destes crimes públicos.
Sim, crime… disse eu e muito bem!... Porque se é verdade que algumas ignições se devem a pura, mas néscia, negligência humana, a maior parte é provocada criminosamente por mentes maléficas, que para a maioria do comum dos mortais, é impossível alcançar.
Será tão difícil perceber que a vida na terra é impossível sem árvores, sem as florestas, sem os verdadeiros produtores de oxigénio indispensável a vida animal. E que a vida deles, dos seus filhos e, muito mais grave, a vida dos seus descendentes vindouros, não será possível se continuarem com estes procedimentos inconcebíveis, de destruição massiva das florestas. Enfim, enfim… “dói-me” muito falar sobre tudo isto. E, para não falarmos do triste cenário negro que fica depois de um incêndio. Não percebo como se porta a consciência de um criminoso, que depois de praticarem esses crimes e no lugar de
magnificas florestas verdes, que parecem autênticas telas pintadas com as cores da vida e de esperança, deparam tão somente com
aquele monstruoso e vasto manto negro, que apenas nos traz à memória encenações triste e de morte.
Mas hoje cá estou eu a dar duas de «treta» sobre tudo isto, e, até porque o pior penso que já passou e tenho a mente mais leve e calma. Mas a verdadeira razão que me levou a tecer este comentário,
foi um muito triste episódio que eu próprio tive a infelicidade de ser o alvo.
Num dia qualquer, já depois de muitas noites sem dormir, muitos quilómetros nas pernas e muitas horas de “bastão” nas mãos, fomos chamados para um incêndio que já deflagrava muito perto de umas habitações, e como tal, merecia-nos cuidados muito especiais. Foi então que um cidadão anónimo se abeirou de mim, com conversa até bastante instruída, dando inclusive palpites com o que fazer aqueles malfeitores que tão impiedosamente destruíam as nossas florestas. Eu concordava com ele e a conversa foi avançando… às "duas por três", o tal cidadão virou-se para mim e disse com tom firme e muito senhor de si: - «
mas ainda bem que arde alguma coisa… se não vocês também não ganhavam nada!...»
Fiquei estupefacto!... Não queria crer no que estava a ouvir… pelo que lhe pedi para repetir e o senhor, sem qualquer rodeio, assim o fez: - «
sim… sempre vão ganhando algum…»
Evidentemente que não ficou sem resposta!
Mas o que mais me entristece e que muito nos ofende é o facto de sabermos que ainda existe muito boa gente a pensar que os Bombeiros Voluntários, sejam de Salto ou de qualquer parte do País, recebem alguma coisa quando são chamados para prestar socorro às populações, quer no combate a Incêndios, ou noutra qualquer missão de ajuda.
Caríssimos…
Este ano foi particularmente muito difícil para os Bombeiros. Começámos com o temporal de Janeiro, com muito chuva e ventos fortes, que derrubaram centenas de árvores e as prostraram para a estrada, sendo necessário retirá-las, para que trânsito afluísse normalmente, executando esse trabalho mesmo debaixo daquela medonha tempestade.
Depois veio a neve. Foi necessário rebocar quem ficou retido nas estradas, transportar pessoas e socorrer aldeias isoladas. Sempre a trabalhar debaixo de neve e frio intenso.
Ultimamente foram os Incêndios e o caos que todos conhecem. Foram três ou quatro semanas consecutivas de trabalho intenso. Dia e noite sem parar, sem tempo para descansar, nem sequer para dormir, atendendo a centenas de Incêndios.
E depois ainda recebemos estes agradecimentos… enfim… mas queremos acreditar que ainda existem pessoas de bem e que realmente reconhecem o nosso árduo trabalho. São esses que na verdade nos dão alento para continuar.
Por isso sei que não será fácil demover-nos. Não será fácil demover este magnífico grupo de trabalho, estes magníficos soldados da paz, que não regateiam esforço, dedicação, sacrifício e empenho, para cumprir exaustivamente as suas tarefas humanitárias, e, frise-se, graciosamente…
Agora, para vós, meus bravos bombeiros, estou muito orgulhoso de todos vós, os meus sinceros e públicos parabéns, porque realmente sois um magnífico grupo de trabalho. E acreditai, para aqueles que não sabem o que dizem, aquela velha máxima assenta muito bem: “palavras loucas, orelhas moucas!...”
Conto e contarei sempre convosco!... Um abraço.
O 2º Comandante
Sílvio Magalhães